quarta-feira

Dia cheio !
Enfim, é a vida...


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Logo pela manhã, tive a "agradável" surpresa que a minha carroça Fiat: enguiçara!
Não pegava nem por um....(vc sabe).

Bem, não deixei que a irritação ou a indignação, de um carro que ficou alguns dias parado para conserto, tomasse conta do humor, logo pela manhã.

À tarde, vim almoçar em casa, para esperar o reboque.
Eu estava na garagem do meu prédio, esperando...e chega o reboque.
O homem, um homem forte, de meia idade, aproximou-se do capô.
Abriu o capô, e assim como estava, com a mão direita ainda levantada acompanhando o movimento, parou.
Subitamente, sentia-se mal.
Foi ao tanque molhar o rosto. Sentou num degrau. Suava. Tinha náuseas. Providenciei água pra ele beber.
Alguém foi telefonar para a oficina, que o mandassem buscar.
Ele parado, quieto, suando. Estava se sentindo muito mal, me disse. Dor no estômago, disse ainda. (só, que não se torcia, não se lamentava, não tinha um esgar, nada!) Muito mal, repetiu.
Enxugava o suor com a ponta da camiseta, o rosto parado enfrentando a dor.
Eu acocorada diante dele, tentando ajudá-lo com a minha presença enquanto o socorro não vinha.
Então ele levantou o olhar pra mim, e ficou olhando nos meus olhos, fundo, demoradamente, como um homem só olha uma mulher quando a quer ou quando está clamando sem palavras.
Por aquele olhar eu soube que ele estava enfartando, e que talvez estivesse começando a morrer.
Depois, quando já o havíamos levado de urgência para o hospital, quando estava na UTI e falei com o chefe dele e a esposa, ficamos sabendo que mais de uma vez havia tido dores semelhantes, mais leves, porém, sem nunca procurar um médico.

A moça que estava dando faxina aqui em casa, não sabia que lado ficava o coração.
É uma moça esperta, letrada. Vê televisão, revistas, de vez em quando o jornal. Mas não sabe, em seu próprio corpo, onde fica a parte principal do motor.
"Fica do lado esquerdo", respondi quando me perguntou. "Mais para o centro". E vendo que ela pousava a mão no peito, incerta, "é onde bate", acrescentei bobamente querendo simplificar.
A mão dela passeou do lado esquerdo para o direito, subiu um pouco, desceu um tanto. " Bate por toda à parte!”
E a seu modo estava certa.
Talvez na imaginação dela, por pulsar em toda parte, o coração desobrigava -se de ter moradia fixa.

Será que aquele homem sabia onde ficava o coração? Talvez soubesse. Talvez preferisse não saber. O coração mata. O coração como o meu carro enguiça, mata.
E as coisas que matam a gente finge nem saber que existem.
Quando o coração dele doeu à primeira vez, preferiu acreditar que era o estômago. Dava para acreditar. E o estômago, mesmo quando dói, raramente mata. Do estômago pode-se saber onde fica, sem correr grandes riscos.

Se eu disser à moça aqui de casa que ela usa aliança no anular esquerdo pq os antigos romanos acreditavam que um nervo o ligava diretamente ao coração, órgão do amor, é provável que ela nunca mais esqueça o lado certo.
As coisas boas são fáceis de lembrar.

Não reparei se o homem na garagem usava aliança de casado...e certamente não teria sido a hora de falar dos romanos . Nem sei se ele tinha alguma dúvida em localizar o coração. Mas de uma coisa tenho certeza: aquilo que ele preferia não saber, seu corpo sabia com absoluta precisão. Seu corpo sabia que a dor não era de estômago, que o sangue não estava chegando como devia ao coração, e que se algo não fosse feito ele provavelmente morreria.


Isto, que ele foi incapaz de me dizer, seus olhos, sem medo de saber, me disseram.


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