sábado

Toma que o filho é seu

Sempre admirei os casais que adotam crianças. Talvez seja o gesto mais generoso que exista.
Um homem e uma mulher, que por alguma razão não podem ter seus próprios filhos, tomam para si a guarda de um recém-nascido dando-lhe amor, conforto, educação e uma vida de oportunidades pela frente. Pouco importa a eles que não hajam laços de sangue, semelhança física ou que não conheçam a herança genética deixada pelos pais "verdadeiros". O que importa é que a carência de todos, pais e bebê, foi preenchida e que dali por diante será criado um ambiente familiar como outro qualquer.

É uma generosidade diferente da que observamos no dia-a-dia. Você pode ser generosa ao emprestar sua casa de praia para uma amiga veranear, ou conseguir estágio para um estundante recém-saído da faculdade, ou dormir no hospital com um parente que acaba de ser operado. Como estes, há centenas de gestos bacanas que tornam as relações humanas menos egoístas. Só que são gestos momentâneos, que resolvem problemas isolados, sem necessidade de envolvimento posterior. Adotar um bebê é diferente. Não se está brincando de boneca ou fazendo a boa ação do dia. Quem adota uma criança esta adotando também um sentimento que vai crescer a cada minuto e que vai transformar sua vida de maneira definitiva.

Faço essa introdução não para me auto-promover ou me santificar. Não!
Mas para entrar em um assunto delicado, polêmico e triste como poucas coisas costumam ser. É o caso de pais arrependidos por terem doado seus filhos, entram na justiça para reavê-los. Está acontecendo outra vez. Acabei de lê no jornal. E isso me remeteu a um triste, muito triste caso.
Tempos atrás, uma mulher doou suas filhas gêmeas, uma para cada família. Elas foram criadas, até onde se sabe, com amor, num bom ambiente, sem nenhum tipo de discriminação. Na época elas tinham cinco anos. E os pais "verdadeiros" decidirão as querer de volta, mesmo sem condições de criá-las. Requereram a custódia das crianças para entregá-las a uma avó, uma desconhecida para as meninas.

Como se sabe, uma criança de cinco anos tem a estrutura familiar completamente assimilada dentro de si. Ama seu pai e sua mãe com intensidade e sente-se desprotegida sem eles. De que maneira veio ao mundo, pouco importa. o que interessa é que ela já tem referências: seu quarto, seus brinquedos, sua creche, seus amiguinhos, seus vizinhos, sua família. Fora deste círculo, tudo é estranho. Imagine seu filho. Como ele se sentiria se você fizesse a malinha dele e dissesse que ele tem outra mãe, outro pai, outra casa? Nem várias sessões diárias com Freud em pessoa curaria esse trauma.

Os pais adotivos também se sentem legítimos. O que os diferencia dos outros? A gestação, o parto? Absurdo. Eles não alugariam um filho como se aluga um DVD na locadora. Crianças não são produtos que vêm com prazo de validade. A dor de forçar os pais a devolvê-los, de ter assistido aos inocentes chorando, suplicando para ficar, deve ser pior do que qualquer tortura.

Não entendo nada de Direito, a não ser que não se faz justiça baseando-se em reações emocionais, mas adoraria que houvesse uma lei assim: pais que dão seus filhos em adoção, não importa o grau de instabilidade mental ou de miséria em que viviam na época, ficam proibidos de reavê-los. Poderão visitá-los, mas requerer a guarda definitiva, nunca mais. O Brasil tem milhões de adultos analfabetos que tomam atitudes impetuosas sem pesar as conseqüencia. É muito triste. Mas mais triste ainda é obrigar homens e mulheres a abrirem mão de uma paternidade já iniciada. É o que se chama mutilação.
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