segunda-feira

O outro tipo de ação

Existem filmes de ação com tiroteios, velocidade, cenas multipicotadas, sustos, finais bombásticos, superproduções. De vez em quando, muito de vez em quando, até gosto.
antes do sol de por

Mas os filmes de ação que estão entre meus preferidos são aqueles que, aparentemente, não têm ação nenhuma. Os filmes do Woody Allen, por exemplo.. Os personagens são pessoas frágeis, ternas, neuróticas e românticas, como muitos seres humanos que cruzam com a gente nas ruas. Todos comem e bebem o mesmo que nós e moram em apartamentos de verdade, quase dá para sentir o cheiro do café vindo da cozinha. Os sentimentos da platéia não são manipulados: não há hora do medo, a hora do suspense, a hora do alívio. Seus filmes deslizam sem chegar a clímax algum. E, ainda assim, tanta coisa acontece.

Foi mais ou menos isso que senti vendo “Closer”- Perto Demais que comento com atraso.
O filme discute relações. Identifiquei-me muitas vezes em vários personagens e algumas vezes não gostei do que vi.

Agora, o último que assisti foi “Antes do pôr-do-sol” filme que dá continuidade ao “Antes do Amanhecer”. O filme é um blábláblá ininterrupto entre um casal que caminha por Paris e discute a vida e a relação. Filme cabeça ou filme chato, rotule você. Mas não diga que não é um filme de ação.

Medo, suspense, aflição, expectativa: diálogos também provocam tudo isso. Como não sentir-se especialmente tocado por uma jovem mulher que admite ter perdido a ilusão do amor e que passou a viver blindada, refratária a qualquer nova relação? Como não sentir-se mexido quando um homem admite que casou porque todos casam, que passa 24 horas por dia infeliz e que a única coisa que lhe justifica a vida é o filho de 2 anos? O que pode ser mais merabolante, impactante, desestabilizante, emocionante do que ver duas frágeis criaturas, um homem e uma mulher predestinados um ao outro, enfrentando a crueza da distância física e do tempo, e a irrealização de seus sonho? Não se costuma catalogar estas pequenas crises existências como filmes de ação, mas elas me prendem na cadeira como nem uma dezena de “Matrix” conseguiria.

Luz, câmera, ação: e então filma-se o silêncio entre um homem e uma mulher que não se vêem há nove anos, e então filma-se todas as dúvidas sobre se devem se tocar ou não, se beijar ou não. Então filma-se o papo inicial, cauteloso, até que chega a hora da explosão, dos desabafos, da acusações e do quase-choro.Então filma-se o que poderia ter sido –especulações – e o que será daqui por diante – especulações também.

E se o que faz o amor sobreviver for justamente a falta de convivência e rotina? Quem apostaria num amor apenas idealizado? E se a nossa intuição for mesmo a melhor conselheira e não merece ser desprezada? E se nossas lembranças nos traírem? E se casamento nenhum for mais importante do que um único encontro?

O cinema pode colocar pessoas desafiando a gravidade, cortando pescoço uns dos outros, fazendo o tempo andar pra trás, e eu não me emocionarei nem ficarei perplexa, mas me dÊ um pouco de realidade e isso me arrebata.

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