quarta-feira

AS AMARRAÇÕES PERFEITAS PARA CONTROLAR (OU NÃO) O DESEJO

Ninguém sai impune à realização dos próprios desejos. Ainda bem. Há dias em que a gente quer ser bem castigadinha. Cá entre nós, que graça tem bancar sempre a boa moça?!
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Quando ele entrou no quarto, camiseta branca colada ao corpo, jeans descolado, olhos de lince percorrendo minhas colinas, logo vi que a noite seria insana. Ele tinha a segurança dos veteranos num semblante de novato, a combinação exata dos gestos doces com a frieza do carrasco. Pendurou no cabide a jaqueta de couro que trazia jogada sobre o ombro. Do bolso da mochila, puxou um cigarro. Acendeu com um isqueiro prateado, numa pequenina chama a gás. Deu um trago profundo. Recostou-se, um pé no carpete, o outro no grande espelho da parede e, numa pose displicente e ereta, me analisou. O silêncio e a fumaça era tudo o que havia entre nós

Sentada numa poltrona, a três metros de distância, com uma taça de vinho na mão e a curiosidade entorpecendo-me, esperei-o fumar. Um ar de mistério pairava entre a intensidade das coisas que ele não dizia e os movimentos que ele deixava de fazer. Quieto e sorrateiro. O que ele estaria arquitetando? Ele era de poucas palavras. Também, com aquela boca apetitosa, quem pensaria em conversar? Tivemos toda falta de pressa do mundo para nos observarmos. A cada tragada, nossas retinas entranhavam-se uma na outra, mais e mais. A cada gole, passeávamos um pelo corpo do outro.

Gostei desse jogo de entranhamento e estranhamento inicial. Deu uma quebrada na dimensão do tempo. Um minuto de silêncio entre quatro paredes com um desconhecido parece uma eternidade. Você entra numa espécie de transe, as sensações tornam-se tangíveis, o cheiro condensa, os ouvidos aguçam-se. A pele sente a carícia do olhar e, sobretudo, as chibatadas rasantes que pequenos gestos, como ondas, propagam pelo ar.

Ele apagou a guimba no espelho e jogou-a no chão. Estava escrito em seu rosto que ele sabia o que fazer. Moveu-se em minha direção. Um espasmo aflito desprendeu-se de mim. O simples descolar de seus lábios revelou-me um abismo de perdição. De súbito, meu espartilho carmim encolheu. Um tesão avassalador queimou-me. A fumaça já não era de cigarro: era meu peito em chamas. Na penumbra daquele quarto de motel, ferormônios piscaram feito vaga-lumes. Fechei os olhos.

Dedos-formiguinhas deslizaram sobre a minha mão, antebraço, ombro. Próximos ao pescoço, saltaram de pára-quedas e recomeçaram o percurso, desta vez ziguezagueando entre os poros arrepiados. Na terceira vez, fui catapultada do prazer ao susto: um tapa seco estalou na minha cara. Saí do transe, abri os olhos. Ele estava face a face comigo. Ajoelhado entre as minhas pernas, puxou-me o maxilar com delicadeza. A língua contornou o desenho da minha boca, lambeu os cantinhos, insinuou-se sem entrar. Anestesiada, não reagi quando, sem pedir licença, o músculo morno invadiu-me a garganta.

Não me desnudou. Soltou as quatro presilhas, arrancou minha calcinha, abotoou novamente. Fiquei com um vão de pele e carne macia entre a meia de seda e o corpete. Um espaço que ele explorou com maestria. Mãos desinibidas me abriam, fechavam, tateavam contornos, coxas, panturrilhas. Abocanhadas e mordidas redesenhavam a circunferência do meu quadril. As esquinas lisinhas das virilhas. A profundidade da minha caverna. Da minha alma.

Forte feito um touro, ergueu-me nos braços e me depositou sobre a cama. Me admirei com a facilidade com que me carregou no colo. Não sou do tipo mignon e muitos homens mais encorpados já suaram nesse intento. Ele nem pestanejou. Força bruta: eis um ponto importante a ser avaliado se porventura e loucura da minha cabeça eu estivesse pensando em me deixar imobilizar por ele. É óbvio que eu não deveria. E não recomendo. Shibari, a técnica japonesa de amarrações com cordas, requer cumplicidade e confiança total. É um alto risco praticá-la com um desconhecido. Mas, ah, se seguíssemos a razão,sexo perderia a metade da graça

Ser marionete não me saía da cabeça. Tem dias que estou a fim de servir. Às vezes gosto que me digam o que fazer, que me provoquem, inclusive que me imponham o que devo querer. Tortura sem dor é tão bom. Existe coisa melhor do que uma técnica com estimulação erótica constante e crescente, em que você fica impossibilitada de se safar e, quanto mais se debate, mais tesão sente? Não há. O shibari é imbatível. Por isso a fama, o reconhecimento, a legião de adeptos. E a minha insanidade em ceder-me sem limites

Ele nem perguntou. Sacou um bolo de cordas da mochila e, enquanto me desembrulhava do espartilho, me arrematava com amarras. Passou três voltas sob os meus seios, três acima e, com uma terceira corda, amarrou na vertical as outras duas, torcendo bem, deu a volta no meu pescoço, como um top frente única e finalizou nas costas. Achou confuso? Você não imagina as outras seqüências que ele criou. A noite entrou pela madrugada. O moço mostrou-se um artista. Meu ego como musa inspiradora foi pra estratosfera. Se é que algum dia tenha ficado abaixo disso.rs

Ao terminar, acendeu outro cigarro. Me admirou. Tirou fotos. E a camisa. Até então, só eu estava nua. Ele, compenetrado, me trabalhou como a uma obra-prima. Deixou-me inteira amarrada à cama, cordas comprimindo pontos "G", descomprimindo gemidos. De quatro, crucificada em diagonal, fiquei vulnerável a qualquer intenção dele, boa ou má. Ele era bonzinho, aliviou-me nós apertados em troca de beijos. Ele foi mau:tirou a calça. Mamãezinha. Foi nessa hora que exclamei "misericórdia". O músculo morno a invadir-me a garganta agora era outro.

Mal pude me defender. Fui abusada em todos os orifícios. Abuso é uma forma carinhosa de chamar aqueles arrombamentos. Estocadas violentas, lentas, generosas, nada gentis, carícias eletrizantes, palmadas rápidas, uma verdadeira aula de golpes orientais. Golpes baixos. Alguém tem dúvida que vou virar freguesa? Devia ser geneticamente proibido alguém nascer com tantos centímetros quando muitos sobrevivem com tão poucos. Refiro-me à grossura. Ao comprimento, meu bem, só vendo pra crer.

Agora estou aqui, numa banheira de salmoura para curar as feridas, tomando um chá de melissa, degustando os momentos vividos. Acredite você ou não, só no final da sessão me dei conta: Ele não emitiu uma sílaba sequer. Partiu com suas cordas, seus olhos de tesão e minha vontade de quero mais. Foi embora levando o silêncio, deixando-me sem palavras.

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http://msn.bolsademulher.com/amor/materia/shibari/45752/1/

2 comentários:

Unknown disse...

Delicia de relato... de entrega... de submissao...
Perfeito...

adorei...

bjs

Suave disse...

Beijíssimas, Nanda!
Obrigada pelo comentário e visita ;)

 
Suave